Miguel Guedes
Ao contrário do que Vladimir Putin previra, o "Dia da Vitória" que assinala o triunfo das forças soviéticas sobre a Alemanha Nazi em 1945, não anunciará a capitulação da Ucrânia à sua "operação militar especial".
Na próxima segunda-feira, 9 de Maio, a Praça Vermelha desfilará em Z. Ao contrário do que Vladimir Putin previra, o "Dia da Vitória" que assinala o triunfo das forças soviéticas sobre a Alemanha Nazi em 1945, não anunciará a capitulação da Ucrânia à sua "operação militar especial".
Moscovo prepara-se para uma parada bélica sem precedentes, demonstração de força em versão-montra de 10 mil soldados e de quase uma centena de asas e hélices de combate aéreo, com direito a um travo de exposição do fim dos dias através dos mísseis de longo alcance capazes de transportar ogivas nucleares. Propaganda ao mais alto nível, este ano sem a presença de convidados ou de referências internacionais.
Desde 24 de Fevereiro, início da ofensiva russa, os teóricos das "operações-relâmpago" têm revisto em baixa a sua métrica de velocidade. A guerra na Ucrânia está para durar e para fazer vítimas. O cansaço e a surpresa já se introduzem no discurso oficial. Mesmo Lukashenko, presidente da Bielorrússia, admite que não esperava que o conflito se "arrastasse por este caminho". É indiscutível que os planos de Putin, estrategicamente decididos, medidos e ponderados há meses, sofreram um enorme abalo quando se depararam com o choque da realidade.
Graças a uma lei com a própria assinatura, Vladimir Putin poderá ultrapassar os quase 30 anos de poder de Josef Stalin, completando 36 anos de poder absoluto. Caso não capitule, o líder russo pode eternizar-se como presidente até 2036, candidatando-se a dois novos mandatos. Com atraso significativo nos seus "timings" de guerra, cada vez mais isolado e com a Rússia como Estado pária do direito internacional, as manifestações magnas de poder são para Putin tão importantes como as leis internas que o eternizam no comando. Sem o poder de facto ou sem a percepção clara desse poder, nenhuma lei se mantém letra viva.
Como se tinha como certo, a inexistência de uma porta de saída é para Putin o maior alimento bélico que necessita para se autojustificar, ainda que recorrendo aos mais insidiosos argumentos e incompreensíveis justificações. As recentes declarações de Sergei Lavrov, ministro dos Negócios Estrangeiros russo, sobre a presença de sangue judeu em Hitler, não resistiriam a um polígrafo de guerra da própria propaganda russa. Apoiado numa teoria da conspiração, as declarações de Lavrov obrigaram Putin a pedir desculpa a Israel, ainda que o ministro tenha reiterado as palavras. Assim, primeiro foi a "desnazificação" da Ucrânia. Agora, fica para a História que a Rússia também tentou "desnazificar" Adolf Hitler. Provavelmente, ao som paramilitar de Wagner.